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JULGAMENTO
SEGURANçA
Vilmar Novello é condenado por homicídio culposo, sem intenção de matar: ‘jamais tinha visto tamanha aberração jurídica’
Autor de morte do irmão com seis tiros, Vilmar Novello recebeu pena de dois anos e um mês de prisão. Promotor Evandro Kaltbach, que atuou na acusação, enviará recurso para anulação do julgamento: ‘não haverá chancela do Tribunal de Justiça à tamanha aberração'
5 anos atrás
Condenação do réu Vilmar Novello levou em consideração a legítima defesa (Foto: divulgação Polícia Civil)
Na última sexta-feira, dia 22 de novembro, ocorreu o julgamento de Vilmar Novello, acusado de matar o irmão em janeiro de 2018. Na época, Danilo Novello, de 50 anos, foi morto com três tiros nas costas, um na nuca e mais dois na lateral do corpo quando já estava caído, durante um chá de fraldas no salão da comunidade de Pedras Brancas. Cerca de 24 horas depois do ato, o irmão compareceu à Delegacia de Polícia Civil de São Marcos, entregando a arma utilizada (calibre 38) e afirmando ter agido em legítima defesa. O julgamento do réu iniciou às 9h30, no Fórum de São Marcos, com a presença de cerca de 40 pessoas, entre familiares e conhecidos da vítima e do réu. Para que a sessão fosse instaurada, pelo menos 15 pessoas convocadas para o júri popular deveriam estar presentes no horário. Diante das presenças, foram sorteadas as sete pessoas para compor o conselho de sentença.
O promotor de Justiça do município, Evandro Kaltbach, que atuou como o promotor responsável pela acusação, explica que o julgamento iniciou com o pronunciamento das testemunhas. “Tivemos a oitiva das testemunhas. Foram dez no total, sendo cinco da acusação e cinco da defesa. Depois teve sequência com o interrogatório do réu”, detalha. Houve intervalo das 13h às 14h para almoço. No retorno, ocorreram os debates, ou seja, argumentação oral da acusação e defesa, com 1h30 para cada parte.
Conforme o promotor, o julgamento do homicídio é feito com base em seis quesitos, não sendo julgado no todo, e sim em diferentes aspectos. Os quesitos são votados pelo conselho de sentença (composto pelo júri popular). “Tem seis quesitos, que dizem respeito às teses apresentadas pela acusação e defesa, mas alguns, dependendo do julgamento, ficam prejudicados. O primeiro é a materialidade, segundo autoria, terceiro absolvição e o quarto é o excesso. Não passou pelos outros dois quesitos, que seriam as qualificadoras e privilégio, que poderiam aumentar a pena”, explica o promotor.
No momento em que o conselho de sentença julgou o quarto quesito, os jurados entenderam que o autor dos disparos, o réu Vilmar Novello, teria sido imprudente no ato, ou seja, não teve dolo ao matar. Dessa forma, ele foi julgado por homicídio culposo, quando não há intenção de matar, pois o conselho de sentença aceitou a tese da legítima defesa. Assim, com base no julgamento do conselho, a pena aplicada pela juíza foi de dois anos e um mês de prisão em regime semi-aberto. “No momento que reconhece que foi excesso culposo em legítima defesa, alguns quesitos são prejudicados. Entendeu-se que ele teria sido imprudente ou imperito ao efetuar os disparos”, ressalta Evandro Kaltbach.
Promotor encaminha pedido de anulação do julgamento
O promotor Evandro Kaltbach, que atuou na acusação do réu, avalia o julgamento de Vilmar Novello como uma decisão contrária à prova dos autos, defendendo que o caso se trata de um homicídio doloso consumado, e não homicídio culposo. “Foram 4 tiros disparados pelas costas, sendo 3 nas costas e um na nuca. A vítima caiu ao solo e foi atingida com mais 2 disparos na lateral do corpo. É documental e pericialmente comprovado, que esses dois tiros foram alvejados à vítima depois que já estava caída e prostrada ao solo. Eles foram comprovadamente feitos de cima para baixo, conforme o trajeto do projétil da arma de fogo”, ressalta o promotor. Diante disso, ele interpôs recurso com pedido de anulação do julgamento. Se o pedido for aprovado pelo Tribunal de Justiça do Estado, o julgamento ocorrido nesse dia 22 de novembro, no Fórum de São Marcos, é anulado e outro será remarcado. Caso o próximo apresente o mesmo resultado, não será possível uma nova anulação. “Em caso de anulação é convocado um novo julgamento, com um novo conselho de sentença. Em um ano acredito que seja remarcado”, prevê o promotor de Justiça.
Evandro explica que a decisão do conselho de sentença só pode ser cassada quando é contrária à prova dos autos. De acordo com ele, esse é o caso do julgamento de Vilmar Novello. “O Ministério Público afirma que a decisão do júri foi evidentemente contrária à prova dos autos, não se sustentando minimamente sob qualquer ângulo que se possa analisar e imaginar a prova produzida. Em quase 21 anos de carreira, posso afirmar que jamais tinha visto tamanha aberração jurídica como a deste julgamento, um descalabro jurídico e social”, afirmou o promotor ao Jornal L’Attualità.
Questionado sobre as chances da anulação do julgamento não ser aprovada, o promotor se mostra confiante. “Não tenho dúvidas em afirmar o tamanho do equívoco desta decisão. Não haverá chancela do Tribunal de Justiça à tamanha aberração, não se tendo dúvidas, portanto, provimento do recurso Ministerial para os efeitos de se cassar referida decisão e submeter o réu a novo, correto e justo julgamento. Tribunal do Júri é Tribunal de Justiça, e não tribunal de piedade ou benevolência”, pontua Evandro Kaltbach.
‘É um alerta para que o conselho de sentença de São Marcos comece a julgar esse tipo de crime com mais rigor’
Contrário à decisão do julgamento, o promotor Evandro Kaltbach defende que o homicídio cometido por Vilmar Novello teria sido, sim, praticado com a intenção de matar. Por isso, refuta a acusação como homicídio culposo. Ele esclarece, ainda, que a decisão sobre o crime é estabelecida com base nas avaliações do conselho de sentença, formado pelo júri popular, e a pena é definida pelo juiz. “Depois de analisados os quesitos, é estabelecido o julgamento com votação dos quesitos pelo conselho de sentença. A juíza Ana Paula Della Latta aplica a pena, de acordo com o que foi decidido pelo conselho”, esclarece, ressaltando sua insatisfação. “É uma pena absurdamente ridícula, com regime aberto. É absurdamente ridículo o preço de uma vida”, critica.
‘São essas aberrações jurídicas que me fazem acreditar que o tribunal de júri tem que ser extinto’
O promotor de Justiça de São Marcos, Evandro Kaltbach, lembra, ainda, que outros dois julgamentos foram anulados em São Marcos devido à inconsistência da votação do conselho de sentença. Um deles, do réu Pablo Maziero, foi anulado e submetido a novo julgamento, e o de Onivoch Macedo, que, por decisão contrária à prova dos autos será submetido a novo júri. “É um alerta para que o conselho de sentença de São Marcos comece a julgar esse tipo de crime com mais rigor. São essas aberrações jurídicas que me fazem acreditar que o tribunal de júri tem que ser extinto, em que crimes gravíssimos, dos mais graves do código penal, são julgados por pessoas leigas e não por juiz de direito”, ressalta o promotor de Justiça de São Marcos.